A humanidade dos sem-abrigo retratada em pinturas
“Faço o que posso, porque não conseguia dizer que sou um seguidor de Cristo e, depois, não olhar de frente para tantas pessoas que sofrem”.
“Há vários anos, encontrei-me com uma mulher sem abrigo, já de idade. E ela mudou a minha vida”, diz o P. Guy Blair, SCJ. “Depois desse encontro, quando entrava nas lojas ou andava nas ruas, já não conseguia ‘passar por cima’ dos sem-abrigo. Já não conseguia falar de Jesus Cristo, sem dar algo de mim mesmo, sem fazer algo por eles”.
Esse “algo” foi o início de um apostolado informal entre os sem-abrigo, que começou há dois anos em San Antonio, no Texas. “No início, eram algumas pessoas para quem eu preparava refeições diárias e a quem fornecia bens de primeira necessidade”, refere o P. Guy. “Agora, estabeleci um limite de 20 refeições diárias e tenho aceitado a ajuda de pessoas de vários grupos bíblicos que oriento; eles dão-me dinheiro para comprar mercearia, tendas, cobertores e vestuário. Algumas pessoas têm mantido uma grande fidelidade a preparar refeições, que depois me trazem para as levar aos sem abrigo. Algumas também me têm acompanhado, quando vou ajudar e encontrar-me com os sem abrigo de quem falo tão frequentemente”.
“Compreendo a dificuldade de entrar na vida dos sem-abrigo. É uma experiência que requer grande humildade e coragem. Chega a ser embaraçoso, porque percebemos que as nossas queixas vão parar à cara de pessoas que comem o que vão encontrando nos caixotes do lixo. Há tantas para dizer sobre isso, há tanto sofrimento”.
Ele desejava conhecer os sem-abrigo que ia encontrando, isto é, conhecê-los como indivíduos. Começou por oferecer-lhes 10 dólares para se sentarem com ele e dar-lhe uma entrevista. “Pergunto-lhes como é que foram parar à situação em que se encontram e o que é que os mantém vivos”, diz o P. Guy. “Há algumas histórias que revelam uma grande coragem. Mas a maior parte delas são angustiantes e desoladoras. Pelo menos um homem que eu conhecia cometeu suicídio. Ainda hoje, quando penso nele, sinto-me atormentado”.
Durante a entrevista, o P. Guy pergunta à pessoa se pode pintar o seu retrato. “Digo-lhes que quero fazer um retrato deles, mas não um em que possam ser facilmente reconhecidos”, conta-nos ele. “Geralmente tento fazer um retrato mais psicológico, concentrando-me em algo que revele a sua personalidade”. Até agora estou surpreendido por ter sido capaz de captar as semelhanças destas pessoas”.
Jesus cai pela primeira vez: “Ele vive debaixo de uma ponte de autoestrada. Presumo que, na sua mala, leva todos os seus pertences…”.
O seu plano inicial era servir-se as pinturas para “despertar interesse público pela miséria das vidas destas pessoas”, refere o P. Guy. Mas agora, com oito retratos já feitos, não tem a certeza de como quer partilhar as pinturas. “São pinturas bastante pessoais”.
No entanto, partilhou aqui dois dos seus quadros.
“Tinha falado com os dois homens, pedindo-lhes autorização para fazer as pinturas, depois de lhes explicar o motivo por que o queria fazer e eles mostraram-se recetivos”, diz o P. Guy. “O homem da camisa laranja falou comigo, quando estava a deitar-se na terra, e disse-me: ‘Vou-me embora daqui esta noite’. O outro homem vive debaixo da árvore; eu consegui fazer o seu retrato quando tentava levantar-se”.
“Tenho de admitir que estas pessoas me deixam com o coração aos pedaços, sobretudo depois de ouvir as suas histórias”.
O P. Guy descreve-se a si mesmo como um artista autodidata. Há seis anos que faz pintura. As imagens dos sem-abrigo foram feitas em pastel.
“Isto é sobre os sem-abrigo, não é sobre mim e nem sequer sobre o meu apostolado”, diz o P. Guy. “É um escândalo que, no maior país do mundo, não haja um plano nacional para ajudar os nossos próprios cidadãos”. Também acho vergonhoso o pouco que a nossa Igreja está a fazer. Era suposto mobilizarmos mais ajuda para as pessoas que sofrem à nossa volta, mas não parece que a sua pobreza e as suas escandalosas necessidades nos comovam”.
“Faço o que posso, porque não conseguia dizer que sou um seguidor de Cristo e, depois, não olhar de frente para tantas pessoas que sofrem”.