“Nosso carisma profético põe-nos a serviço da missão salvífica do Povo de Deus no mundo de hoje.” (Constituições SCJ n. 27)
No dia 12 de março de 1938 foi erigida a “Província Brasil do Norte” da Congregação dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus. Atualmente chamada de Província Brasil Recife ou BRE, esta presença dehoniana no Nordeste resgata a sua história de 77 anos celebrando a memória de oblação pelo Reino do Coração de Jesus a fim de assumir com renovado ardor a sua missão a serviço do Povo de Deus. A Igreja é missionária porque participa da missão de Cristo. Comunidade de discípulos missionários nascidos do Batismo e alimentados pela Palavra e pela Eucaristia, a Igreja existe pela missão e para a missão como continuadora no tempo e na história da obra redentora de Cristo. No tempo do nosso fundador Padre Dehon, particularmente na segunda metade do século XIX, a Igreja na França sofria por estar fechada aos novos desafios do mundo moderno e por se posicionar muito centrada em si mesma com nostalgia de um tempo de cristandade que já não existia mais; estava acomodada à situação, às obras feitas, sem olhar às necessidades reais do presente e do futuro. Na virada do século, em 1900, o Padre Dehon lançava um apelo forte aos eclesiásticos: “E que dizer do zelo? Face à dificuldade do nosso papel, não perdemos coragem? Não repetimos aquela palavra de traição não há nada a fazer, quando há tudo a fazer? Mantivemos e aperfeiçoamos os nossos estudos? Fundamos as obras que respondem às necessidades atuais?” (OSoc.IV, 564-565). Dehon sonhava com uma Igreja missionária aberta ao povo e atenta às mudanças dos novos tempos.
“É preciso ir ao povo! É preciso… Os sacerdotes não podem ficar mais fechados nas suas igrejas e nas suas casas paroquiais. É preciso animá-los do espírito apostólico… Vejam até aonde chegou a ilusão dos piedosos sacerdotes. Eles viram o mal crescer. Assistiram à apostasia de todo um povo e criaram… associações de meninas” (OSoc. II, 153.157). Padre Dehon também era um homem muito sensível ao trabalho missionário além das fronteiras das nações (missão ad gentes) acentuando que todo o mundo é uma extensa terra de missão, começando pela França, passando pela Europa e chegando a todos os continentes. Por isso já não havia mais tempo para o padre e mesmo os fiéis se fecharem nas igrejas e nas sacristias. O próprio Dehon desejava ser missionário e sentia-se missionário: “O ideal da minha vida, que formulava com lágrimas na minha juventude, era o de ser missionário e mártir. Parece-me que esse voto cumpriu-se. Sou missionário pelos cem missionários que enviei a todas as partes do mundo; e mártir também, pelas terríveis provas pelas quais tive de passar nestes longos anos” (NQ XLV, 1-2). Além disso, encorajava os seus missionários espalhados pelos mundo: “Sejam como fogo para fazer conhecido o amor do Coração de Jesus em todas as partes. Aceitem as cruzes da Providência como um meio infalível para fecundar o seu apostolado. Sejam generosos até ao fim e o seu desejo seja o de morrer na missão, para que o seu sacrifício seja completo e sem reservas” (Arquivo Dehoniano B-38/6).
A Província BRE nasceu como fruto da sensibilidade social e missionária do Padre Dehon que desejava ver continuada sua obra em prol da “instauração do Reino do Coração de Jesus nas almas e na sociedade”. A missão SCJ no Nordeste iniciou-se no dia 03 de fevereiro de 1893 quando chegou à cidade de Recife no Estado de Pernambuco o Pe. Sebastião Miquet, enviado pelo Padre Dehon para trabalhar no cuidado pastoral dos operários da Fábrica de Tecidos da Companhia Industrial Pernambucana que ficava em Camaragibe no município de São Lourenço da Mata. O Pe. Sebastião Miquet iniciou sozinho a missão SCJ com os operários em Camaragibe. Em 1895 chegou o Pe. Maximino Cottard para reforçar a missão. Entre os anos de 1896 e 1902 foram enviados os confrades Pe. Liduino Richters, Ir. José de Broglie, Pe. Ângelo Deal, Pe. Longino van Heugten, Pe. Estanislau Schimanski e Pe. Pedro Graaf. Aos poucos nossos missionários foram assumindo, além do trabalho com os operários, o cuidado pastoral de paróquias da região. As dificuldades para os inícios da missão foram inúmeras e algumas decepções foram vividas com espírito de sacrifício. Alguns destes pioneiros tiveram que retornar à Europa. Muitas lacunas na organização do trabalho pastoral nas fábricas, a carência de recursos para sustentação dos missionários, as longas distâncias entre as diversas paróquias assumidas, a realidade climática da região, o contexto eclesial da época e a realidade social do povo fizeram com que nossos pioneiros se tornassem verdadeiros heróis na manutenção da obra dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus nas terras brasileiras.
Com o passar dos anos, os padres SCJ foram consolidando sua presença e missão no Nordeste. Aos poucos foram chegando outros missionários para se somarem aos pioneiros que passaram os dez primeiros anos no árduo trabalho missionário. Entre os dias 13 de setembro e 11 de outubro de 1906, o Padre Dehon visitou nossos missionários em Pernambuco e Alagoas. Sua presença foi significativa para dar ânimo ao trabalho dos nossos confrades e representou um novo impulso em nossa obra no Brasil. A obra SCJ no Nordeste floresceu com a presença marcante de confrades de diversas nacionalidades (franceses, belgas, holandeses, luxemburgueses), mas progressivamente a Província Holandesa assumiu a responsabilidade de enviar e manter os missionários bem como de gerir a Região SCJ do “Brasil do Norte”. Em 12 de março de 1938 foi canonicamente ereta por decreto promulgado pelo Conselho Geral a Província Brasileira Setentrional e foi nomeado como primeiro provincial o Pe. Henrique van der Horst. Com a criação da Província BS em 1938, a presença SCJ foi se fortalecendo e a missão se expandindo. Nossos confrades marcavam presença no trabalho com os operários, nas associações religiosas, nas paróquias, em colégios e nas casas de formação da província. As vocações floresceram e passamos a ter em nossas fileiras confrades brasileiros. A nossa obra se expandiu para vários estados da região e nos tornamos uma província próspera e vibrante. As dificuldades e os desafios sempre foram constantes, porém conseguimos dar continuidade à encarnação do carisma dehoniano na realidade nordestina. A história da Missão SCJ no Nordeste do Brasil pode ser vista como uma “missão de esperança”. Isto porque o que alimentou o sonho de Padre Dehon e de nossos pioneiros foi a esperança de ver instaurado na terra brasileira o Reino do Coração de Jesus. Celebrando 122 anos de presença e 77 anos de criação de Província, resgatando nossa história e celebrando com gratidão nossa memória queremos com a graça de Deus estarmos disponíveis para assumir a missão com renovado ardor como discípulos missionários de Jesus Cristo segundo a inspiração de Padre Dehon.